A ascensão do anime: de paixão cult a fenômeno global
Impulsionado pelo apoio de grandes celebridades, colaborações fashion e crossovers com games, o anime hoje influencia todos os cantos da cultura pop.
A ascensão do anime: de paixão cult a fenômeno global
Impulsionado pelo apoio de grandes celebridades, colaborações fashion e crossovers com games, o anime hoje influencia todos os cantos da cultura pop.
Durante décadas, o anime viveu à margem da cultura pop ocidental, um segredo amado por poucos fãs dedicados. Mas, numa ascensão cultural impressionante, a animação japonesa deixou de ser um fascínio de nicho para se tornar uma potência global do entretenimento. Não estamos mais falando apenas de “desenhos animados”. Essa transformação representa mais do que o crescimento do público: marca a integração definitiva do anime no imaginário mainstream.
Do nicho ao mainstream
A trajetória do anime rumo à ubiquidade global comprova a força de suas narrativas e a crescente acessibilidade do gênero. O que começou como uma paixão cult nos anos 80 e 90, com séries como Mobile Suit Gundam Z e Sailor Moon que tinham distribuição limitada no Ocidente — acabou explodindo e se tornando um pilar da cultura pop. Naquele tempo, o anime era um hobby de nicho, encontrado em fitas VHS importadas ou em horários de madrugada na TV a cabo, atendendo a um público fiel, porém relativamente pequeno. Avançando para os dias atuais, o panorama é radicalmente diferente.
Um dos motores dessa guinada foi o Crunchyroll, lançado em 2008 como uma das primeiras plataformas a licenciar legalmente um amplo catálogo de anime para o Ocidente, muitas vezes disponibilizando novos episódios poucas horas após a exibição no Japão. Esse compromisso com o acesso oficial impulsionou o rápido crescimento do serviço: de modestos 10 mil assinantes em 2009, o Crunchyroll chegou a 1 milhão em 2017, saltou para 10 milhões em 2022 e, em maio de 2025, já somava 17 milhões.
Esse salto exponencial acompanha tendências mais amplas do mercado, e a Netflix também teve papel crucial. Embora alguns títulos, como Knights of Sidonia tenham desembarcado na plataforma em 2014, foi em 2015 que a empresa passou a investir pesado em anime, adicionando um mix de produções originais e de catálogo, como Castlevania (2017), Devilman: Crybaby (2018) e Aggretsuko (2018). Os números recentes da Netflix reforçam essa guinada: em 2024, animes foram assistidos mais de 1 bilhão de vezes só na plataforma, com a audiência triplicando nos últimos cinco anos. Não se trata apenas de crescimento; é uma mudança sísmica que levou o anime de interesse de nicho a potência de entretenimento mainstream, alcançando mais de 50 % do público da Netflix — ou seja, mais de 300 milhões de pessoas ao redor do mundo.
Essa expansão foi impulsionada sobretudo pelo lançamento simultâneo global: os títulos mais recentes chegam a 190 países ao mesmo tempo, com dublagem em até 33 idiomas na Netflix. Esse alcance inédito derrubou barreiras tradicionais, e entre 80 % e 90 % dos assinantes assistem aos animes dublados, ampliando ainda mais o apelo. Para além dos números, a qualidade e a diversidade das produções conquistaram novos públicos. Enquanto obras pioneiras de Hayao Miyazaki, como Spirited Away, conquistaram aclamação mundial e até um Oscar, outras séries definidoras, como Akira, Cowboy Bebop e Neon Genesis Evangelion ganharam fama tardia, porém cultuada, no Ocidente. Hoje, blockbusters como Attack on Titan, Demon Slayer e Jujutsu Kaisen dominam conversas e rankings. Só no primeiro semestre de 2025, oito animes, incluindo My Hero Academia e The Apothecary Diaries, entraram no Top 10 Global (Não Inglês) da Netflix, comprovando o alcance do formato em diferentes gêneros.
Star Power: Celebridades e seu fandom de anime
A ascensão do anime é inegável, mas nada legitima uma mudança cultural como o carimbo das celebridades. Cada vez mais artistas e figuras públicas deixaram de ser meros espectadores ocasionais para se assumirem fãs apaixonados. Megan Thee Stallion, por exemplo, faz dessa paixão um pilar de sua persona. Ela eleva o estilo “Otaku Hot Girl”, exibe looks inspirados em anime nos tapetes vermelhos e faz cosplay de suas personagens favoritas em editoriais, reforçando seu afeto pela linguagem otaku diante de milhões de seguidores.
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O ator e diretor Michael B. Jordan, também fã de anime de longa data, incorporou elementos de séries como Naruto e Dragon Ball Z à coreografia das lutas e à dinâmica de rivalidade de Creed III, seu filme de estreia como diretor. Da mesma forma, Keanu Reeves cita a cultura japonesa e o anime como grandes inspirações para a franquia John Wick. Esse endosso de nomes de peso sinaliza uma virada significativa: de nicho, o anime tornou-se referência mainstream que ressoa com diferentes públicos.
Os mundos interligados de anime e games
A relação simbiótica entre anime e games há muito impulsiona ambos os setores, apagando as fronteiras entre narrativa interativa e passiva. Durante décadas, IPs clássicas de anime migraram para os videogames, criando experiências imersivas que expandiam tramas adoradas. Na via oposta, franquias de jogos populares como Devil May Cry e Castlevania fizeram o caminho inverso com sucesso, transformando-se em séries de anime, alcançando novos públicos e aprofundando seus universos.
Mais recentemente, essa polinização cruzada ficou ainda mais evidente. Títulos como Cyberpunk 2077 ganharam spin-offs de anime aclamados (como Cyberpunk: Edgerunners na Netflix) que não só ampliaram o universo do jogo como também apresentaram a franquia a quem sequer havia ouvido falar dela. A tendência continua com anúncios empolgantes, como o próximo longa animado baseado em Death Stranding, demonstrando o imenso potencial quando esses dois universos criativos colidem.
O impacto cultural do anime e seus crossovers com marcas
Fora das telas, o anime se mesclou profundamente ao tecido da cultura pop global, moldando tendências de moda, hábitos de consumo e colaborações de alto impacto. Esse efeito talvez fique mais evidente na proliferação de estampas de anime e mangá no streetwear, transformando peças básicas em declarações de fandom.
A influência alcança todo o espectro fashion. Grifes de luxo abraçaram o anime com entusiasmo: a Loewe, por exemplo, lançou cobiçadas coleções com o Studio Ghibli — abrangendo My Neighbor Totoro, Spirited Away e Howl’s Moving Castle — que unem acabamento artesanal a universos animados adorados. Outros crossovers de peso incluem Doraemon x Gucci e a recente FRGMT x Pokémon x FENDI.
A febre é igualmente forte no streetwear e nas marcas de fast fashion, com exemplos como mastermind JAPAN × Tokyo Revengers, Princess Mononoke × Levi’s, além de diversas colaborações da UNIQLO UT. As marcas de tênis também entraram no jogo: a ASICS lançou o modelo GEL-NYC inspirado em Naruto Shippuden, enquanto a PUMA apresentou a coleção ONE PIECE . Da mesma forma, a CASETiFY, marca de acessórios tech, lança colaborações frequentes com animes populares, permitindo que os fãs personalizem seus dispositivos com personagens e símbolos marcantes.
Esse vasto leque de colaborações — do mass market ao high-end — prova o apelo versátil do anime e seu poder como motor comercial. Mais do que um conteúdo a ser consumido, o anime é estilo de vida, forma de autoexpressão e uma força capaz de moldar identidades e fortalecer comunidades.

















